Fome é a sensação que sinaliza a falta de energia do nosso organismo. Comer é a forma de dar ao corpo a energia que ele precisa. Satisfação é o sinal de que o nosso equilíbrio já foi restabelecido. Mas nem sempre é assim que funciona.
Na prática observamos muita gente com dificuldade de identificar e diferenciar as sensações corporais. Algumas pessoas podem confundir fome com vontade de comer, ingerir comida demais e se sentir muito cheia ou até mesmo comer e nunca se sentir satisfeita. Podem comer demais quando estão ansiosas ou de menos quando estão tristes e viver com uma sensação de estranhamento em relação a alimentação.
Por que algumas pessoas enfrentam essas dificuldades e como a Psicologia explica essa distorção:
Falta de consciência corporal
A dificuldade de compreender os sinais corporais faz com que as pessoas não consigam dar ao corpo o que ele realmente precisa e isso gera uma sensação de insatisfação muito grande. Por isso é tão importante aprender a ouvir o próprio corpo.
Esse aprendizado pode acontecer de diversas formas. Algumas pessoas são mais sensoriais do que outras e já nascem com mais facilidade para observar o mundo e a si mesmas. Outras pessoas podem aprender a usar sua função sensorial ao longo da vida, através de atividades que exijam atenção ao corpo (como esportes, danças) ou através do contato com adultos que estimulam esse olhar e que ajudam a criança a observar e dar nome para suas sensações.
A grande maioria das emoções desperta em nós sensações corporais em regiões como rosto, maxilar, pescoço e tórax e por isso podem ser facilmente confundidas com a fome e com a vontade de mastigar e engolir.
É por isso que precisamos criar um espaço na nossa vida para ouvir os sinais do nosso corpo, buscando compreender do que realmente ele precisa.
Memórias
Fome e satisfação são duas sensações muito instintivas e que nos acompanham desde o primeiro dia de vida.
Quando nascemos uma das primeiras sensações de desconforto que experimentamos é a da fome, já que dentro do útero éramos alimentados constantemente através do cordão umbilical e a sensação de fome não existia. Junto com a fome o bebê que acabou de nascer sente frio, desconforto com a luz e desamparo pois deixou de estar contido pelo pequeno espaço do útero.
Quando o bebê é alimentado ele experimenta uma sensação de alívio e conforto, não só porque sua fome está sendo saciada mas também porque a amamentação traz o prazer do contato com o corpo da mãe, do acolhimento, dos limites que amparam e do carinho.
Tudo isso acontece bem no início das nossas vidas e por isso resultam em memórias tão fortes. Mesmo que a gente não perceba é muito comum associarmos sentimentos negativos com fome e sentimentos positivos com estômago cheio e por isso seguiremos nossa vida evitando qualquer sentimento de falta e buscando situações que nos trazem um sentimento de plenitude.
Traumas
Encontramos pessoas que passaram por faltas reais em suas vidas. A falta de comida, de dinheiro, de carinho e de atenção podem criar uma ferida psicológica fazendo com que a pessoa se sinta muito angustiada e reaja defensivamente a qualquer situação onde sente que não vai ter algo que precisa. Para essas pessoas a sensação de fome pode ser insuportável e a defesa aparece através do uso da comida para se manter constantemente cheio e satisfeito.
Por isso é tão importante aprender a se observar e se questionar tentando sempre dar nome para as sensações corporais. Entender que nossa forma de se alimentar está relacionada com memórias e aprendizados do passado ajuda no processo de estabelecer novas conexões mentais. Compreender que o vazio e a sensação de plenitude nem sempre estão relacionadas com a comida nos faz ampliar a consciência sobre quem somos e do que realmente precisamos para ser feliz.
Escrito por Flávia Scavone
Psicóloga I CRP 06/58691